conjutivite

tá ventando pra cacete. fechar a porta de vez quer dizer dormir sufocada e abrir um pouquino só é não conseguir dormir com o barulho do vento tentando entrar. em montevidéo a ventania não dava trégua, o cabelo ficava de pé de sair na rua e o pé não podia sair dela porque eu tava procurando um jeito de ir embora, o único jeito: achar um banco, fazer ele cuspir dinheiro na minha mão, pagar meu hostel e pegar um ônibus pra voltar pra casa. enquanto isso não acontecia, eu descansava o meu único olho que prestava em paradas por lugares que eu não faria. el curioso caso de benjamim button: eu sentei na beira da escada e esperei os quarenta minutos que faltavam para eu passar as próximas três horas, observando os vendedores de pipoca e respondendo uma ou outra pergunta que eles me faziam. as pessoas são marrons em montevidéo. gentis e marrons e o vento tem a ver com isso e eu nunca pude explicar direito. acontece que eu ganhei o dom de olhar nos olhos de alguém e saber: eu sei de onde você vem, você vem de montevidéo. no segundo dia eu me esforcei um pouco mais pra entrar no centenário. o segurança, um senhor de bastante idade me acompanhou em todo o caminho, contando as histórias de lá e de cá, tentando justificar porque o uruguai não consegue mais se erguer no futebol. no final ele me deixou na porta de saída, me abraçou com paixão e só não me beijou a testa porque eu disse isso aqui é contagioso; depois na padaria eu sentei pra tomar um capuccino frio e me arrepender dos doces que não eram bons. o vento varre aquela cidade, sem cansaço, e não existe permanência possível assim; ele levanta tudo e leva as coisas embora, traz outras que não vão ficar: acontece que tudo me pareceu arruinado. todas as pessoas marrons me parecem uma, daquelas pessoas segurando com força a alma do vento, e gentis daquilo que sobra quando você não tem chance. daquilo que eu não esqueço e não sei dizer o que é e de algum jeito deixou meus ossos um pouco mais pesados, o meu pesar eu digo, passa por aí. desde montevidéo não há uma janela que eu não abra, uma porta fechada que não me sufoque e por isso tá foda relaxar. por que é que eu não abro logo essa porta? o que diabos é tão importante que eu não posso deixar o vento varrer? do que é que eu não consigo soltar? me diz, de que cor eu to agora?

2 comentários:

  1. aventura com um olho só...

    haja coragem
    & golpes de vista

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  2. curioso pela saideira, ler aqui serve pra te conhecer mais un "tikito"... eee frio

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